O Governo de Espanha disse hoje respeitar todas as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que invalidou dois acordos comerciais com Marrocos, e garantiu que continuará a apostar na “associação estratégica” com o país africano.
O TJUE decidiu hoje a favor dos separatistas sarauís da Frente Polisário, ao invalidar definitivamente dois acordos comerciais na área da agricultura e das pescas celebrados entre Marrocos e o bloco comunitário.
“Respeitamos as decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros (MNE) espanhol, Jose Mnauel Albares, numa audição parlamentar, em Madrid.
Albares garantiu apoio ao setor pesqueiro espanhol e defendeu “a associação estratégica” com Marrocos, que considerou benéfica para os dois países e para a União Europeia (UE).
“A nossa aposta e o nosso compromisso com a estabilidade da relação com Marrocos é firme e não se vai alterar”, afirmou Albares, que garantiu que o Governo espanhol vai continuar “a trabalhar com a União Europeia e com Marrocos para preservar e continuar a desenvolver esta relação, dentro do quadro do ordenamento jurídico, naturalmente”.
O MNE destacou os benefícios dos entendimentos e das boas relações com Marrocos a nível económico e comercial, mas também na defesa de fronteiras, realçando o caso das cidades de Ceuta e Melilla, dois enclaves espanhóis no norte de África que são as únicas fronteiras terrestres da UE com o continente africano.
“Espanha vai continuar a impulsionar, e muitos outros países também, a maioria, essa relação privilegiada entre a União Europeia e Marrocos”, assegurou Albares.
O Tribunal de Justiça da União Europeia invalidou hoje definitivamente dois acordos comerciais celebrados em 2019 entre Marrocos e o bloco comunitário.
Os acordos, sobre pesca e agricultura, de que Portugal também faz parte, foram celebrados em “desrespeito pelos princípios de autodeterminação” do povo sarauí, de acordo com a deliberação do tribunal superior com sede no Luxemburgo.
A Comissão terá de renegociar um acordo comercial com Marrocos, para ter em conta a sua anulação pelo TJUE.
A decisão da alta instância hoje conhecida não tem, porém, consequências no curto prazo.
No caso do acordo relativo às medidas de liberalização dos produtos agrícolas, o tribunal decidiu mantê-lo em vigor durante 12 meses a partir de hoje, “tendo em conta as graves consequências negativas para a ação externa da União que a sua anulação imediata implicaria” e “por razões de segurança jurídica”.
O acordo de pesca já tinha expirado em julho de 2023.
“A União Europeia pretende firmemente preservar e continuar a reforçar as suas relações estreitas com Marrocos em todas as áreas da parceria Marrocos/UE”, especificou hoje um porta-voz da Comissão Europeia.
Já a Frente Polisário – o movimento que luta pela independência do Saara Ocidental – congratulou-se com a decisão do TJUE, considerando que “é a melhor resposta” da justiça “às últimas decisões unilaterais pouco responsáveis” por parte de alguns Estados europeus, em especial França e Espanha.
Espanha passou a apoiar, em 2022, o plano de autonomia proposto em 2007 por Marrocos para o Saara Ocidental, uma antiga colónia espanhola.
O Governo de Madrid mudou assim a posição histórica de Espanha relativamente ao Saara Ocidental já que, até então, defendia os acordos da ONU para a realização de um referendo de autodeterminação.
A decisão de Espanha surgiu após uma crise diplomática em 2021 em que Marrocos fez sentir ao Governo de Madrid a pressão migratória deixando entrar milhares de menores em Ceuta e Melilla.
Também a França anunciou em julho passado que considera que o plano de autonomia marroquino para o Saara Ocidental é “a única base para uma solução política, justa, sustentável e negociada” que esteja de acordo com as resoluções da ONU.
O Observatório dos Recursos do Saara Ocidental afirmou hoje num comunicado que as sentenças do TJUE representam “uma vitória importante” para os sarauís, e instou a UE a “deixar de colaborar com o ocupante”, como descreveu Marrocos, “através de acordos comerciais ilegais”.
Já Marrocos exigiu hoje à UE que aprove as medidas necessárias para respeitar “os compromissos internacionais” e “preservar as conquistas da associação bilateral”.