Termina hoje a consulta pública da Central Solar Fotovoltaica (CSF) de Sophia, um projeto com 390 hectares de área ocupada por módulos fotovoltaicos, 435 hectares considerando todas as infraestruturas e um impressionante total de 1734 hectares de área vedada, localizado nos concelhos do Fundão, Penamacor e Idanha-a-Nova, com uma capacidade prevista de 869 MWpico. A ZERO aproveita para alertar para o facto de que esta enorme contestação que se está a gerar à volta deste mega-projeto poder criar um ambiente social desfavorável à aceitação das energias renováveis em Portugal. Este projeto, que pretende ter lugar A insistência no desenvolvimento de projetos “caso a caso”, que são a antítese do ordenamento do território, a ausência de envolvimento da população nas fases iniciais, a inexistência de partilha de benefícios com as populações locais e a desvalorização dos efeitos socioeconómicos e paisagísticos pode minar seriamente os objetivos de neutralidade climática estabelecidos para as próximas décadas. A associação alerta que a enorme contestação gerada por este mega-projeto, com os seus impactes significativos na paisagem, biodiversidade e socioeconomia locais, pode ser apenas o início de uma “bola de neve” de contestação social e de litigância judicial contra os necessários investimentos em energias renováveis.
Conflitos sociais e ambientais desproporcionais
A ZERO decidiu emitir um parecer desfavorável ao projeto Sophia devido aos impactes locais significativos, a nível socioeconómico e ambiental, subvalorizados por um Estudo de Impacte Ambiental (EIA) que contém deficiências e omissões graves e conclusões enviesadas. O impacte significativo na paisagem, identificado no estudo, é alegadamente mitigado com cortinas arbóreas – sobrevaloriza-se a eficácia destas medidas de mitigação – mantendo o projeto a intenção de se instalar a 20 metros da Aldeia de Santa Margarida (freguesia que perdeu 31,2% da população entre 2011 e 2021) e confinar em 360 metros a Grande Rota das Aldeias Históricas. Este território de baixa densidade demográfica, que tem vindo a enfrentar um declínio acentuado, vê assim um dos principais motivos para o fluxo positivo migratório ser posto em risco, impactando atividades económicas, como o turismo ambiental e cultural, através da industrialização da paisagem e da perda de ruralidade. Além disso, o EIA assume impactes inaceitáveis na biodiversidade e no solo: prevê a desmatação e a decapagem de solo em 1.060 hectares (ha), ocupando cerca de 34 ha de Reserva Ecológica Nacional, maioritariamente em áreas com elevado risco de erosão. Adicionalmente, situa-se parcialmente dentro do Geoparque Naturtejo, com a agravante de se prever o abate de 21 ha de carvalho-negral (habitat com valor global de conservação “muito alto”).
Processo mostra a relevância da Avaliação Ambiental Estratégica em curso
A ZERO, desde 2020, tem chamado a atenção para a necessidade de ordenar as atividades de produção de energia renovável e identificar áreas que evitem impactes significativos na paisagem, nos valores naturais e que beneficiem de aceitação social e de partilha de benefícios.
A diretiva europeia das energias renováveis (RED III), cuja transposição para o direito nacional está em curso, veio obrigar à definição de áreas de aceleração para renováveis, sendo que, para concretizar estas áreas, se iniciou, com um atraso de mais de um ano, um processo de Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) que visa produzir um plano setorial das áreas de aceleração das energias renováveis (PSAAER), para responder às necessidades de produção de energia renovável até 2030. No entanto, para a ZERO é fundamental irmos mais além nestes esforços, para que este plano setorial se transforme num instrumento de ordenamento de território que defina áreas com aptidão para a produção de energia renovável suficientes e necessárias para atingirmos a neutralidade climática em 2040 e, desta forma, impossibilitar o desenvolvimento de projetos em áreas com elevada suscetibilidade à existência de conflitualidade social e impactos ambientais muito significativos.
A AAE é um primeiro passo para que possamos compatibilizar os valores naturais e sociais com a produção de energia renovável, pelo que se apela a uma forte participação no processo de consulta pública disponível no site da AAE de todos os atores envolvidos.
Projeto não reúne condições para ser viabilizado
A CSF de Sophia é o sintoma de uma estratégia de descarbonização desequilibrada. Portugal precisa de eliminar o consumo de combustíveis fósseis, mas o foco em mega-centrais pode estar a desvirtuar outras frentes necessárias da transição energética: aposta na eficiência energética, nas comunidades de energia e mobilidade – é lamentável que os processos burocráticos estejam a atrasar a sua adoção pelos cidadãos, no armazenamento de energia e na eletrificação dos transportes de uso intensivo. Quando deveríamos estar a reduzir o consumo de combustíveis rodoviários no setor dos transportes em 7% ao ano, na realidade, está a aumentar relativamente ao ano passado. Por último, a meta do PNEC, relativamente à potência a instalar através do solar descentralizado é de apenas 5.7%, quando esta deveria ser, pelo menos, de 10% do total da potência instalada em 2030, faltando incentivos que viabilizem um forte crescimento da produção descentralizada.
Para a ZERO, sem um reequilíbrio estratégico, a “bola de neve” da contestação social poderá crescer e vir a comprometer toda a transição energética que é absolutamente crucial.
Fonte: ZERO











































