A energia necessária para a elevação e distribuição da água é o principal custo do grande empreendimento do Alqueva mas na associação das dezenas de planos de água à produção fotovoltaica pode estar a chave para a sustentabilidade do maior projeto hidroagrícola do país.
Os aproveitamentos hidráulicos têm na maioria dos casos habitualmente a sua origem de água em grandes barragens a cotas mais altas que as áreas que beneficiam, possibilitando a adução gravítica. Este não é o caso em Alqueva.
De facto, no Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva (EFMA) as grandes origens de água – as albufeiras de Alqueva e de Pedrógão – estão a cotas mais baixas que as áreas envolventes servidas, levando a que haja necessidade de uma grande estação elevatória, com altura de elevação da ordem dos 70 a 90 m. A esta elevação somam-se outras até ao destinatário final, atingindo alturas de elevação médias da ordem dos 140m e o consequente consumo energético da ordem de 0,5 kWh por metro cúbico de água distribuído.
Alqueva está localizado na região com os maiores níveis de insolação e radiação solar da Europa e o sistema global de distribuição, com cerca de 2000 km de extensão, inclui 47 estações elevatórias e 69 barragens e reservatórios de regularização. Uma vez que a distribuição anual das necessidades energéticas de bombagem segue muito perto a capacidade produtiva fotovoltaica parece estarem reunidas todas as condições para que esta energia renovável tenha aqui particular expressão.
Em virtude dos significativos caudais com as elevações referidas a potência das estações elevatórias é grande, tipicamente na ordem de alguns Megawatts. Ora o fornecimento de potências elétricas desta magnitude com a tecnologia fotovoltaica corrente implica sempre a ocupação de áreas consideráveis que, muitas vezes, não podem ser facilmente utilizadas devido à sua boa aptidão agrícola ou florestal.
As centrais fotovoltaicas flutuantes vêm responder precisamente a estes desafios. A tecnologia está bastante madura existindo já muitas dezenas de projetos de grande escala e novos grandes projetos são continuamente divulgados.
As vantagens de colocar painéis fotovoltaicos sobre estruturas flutuantes são muitas:
- Não compete com outro tipo de utilização do solo pois ocupa tipicamente reservatórios de regularização ou partes de albufeiras que não têm uso alternativo;
- A produção é maior pois o efeito refrescante do plano de água sobre os painéis aumenta a sua eficiência de conversão da radiação em eletricidade;
- A redução da incidência da luz nos reservatórios limita o crescimento das algas contribuindo decisivamente para a qualidade da água e para a diminuições dos custos com a limpeza de filtros;
- A cobertura de reservatórios reduz a evaporação e logo os custos operacionais da distribuição de água;
As vantagens são muitas mas o investimento ainda é elevado contudo esta situação está a alterar-se rapidamente e existem modelos de negócio em que o esforço financeiro inicial é transformado em custo operacional anual.
Hoje já existem muitas situações em que a introdução do fotovoltaico é mais económica que a tradicional ligação à rede. Isto mesmo pudemos confirmar recentemente com a alimentação elétrica a concentradores de comunicações em que o projeto tradicional tinha o orçamento de cerca de 25,000 EUR mas a solução implementada (fotovoltaico offgrid) custou cerca de 5,000 EUR.
Caso semelhante é o da alimentação elétrica ao reservatório e estação de filtração da Cegonha em que o sistema instalado fotovoltaico flutuante com recurso a um banco de baterias teve um custo de investimento igual ao da construção de uma linha de média tensão mas não terá quaisquer custos mensais.
Diz a sabedoria popular que não é boa ideia misturar água e eletricidade, mas em Alqueva esta mistura parece virtuosa e pode muito bem ser a chave para garantir um futuro de produtividade, eficiência e respeito pela natureza.
José Pedro Salema
Presidente da EDIA – Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva, S.A.