Depende de todos, portanto, também da comunidade científica, a rápida implementação de medidas concretas que contribuam para a mitigação e, mais importante, para a capacidade de adaptação às rápidas mudanças ambientais em curso.
No relatório global de clima para o ano de 2017 o qual combina a temperatura média do ar e do oceano, observou-se que, entre 1998 e 2017, ocorreram os dez anos mais quentes desde 1880 (NOAA, 2018). Uma avaliação realizada pela Agência Europeia do Ambiente (AEA) mostra que, não obstante os progressos alcançados em algumas áreas, a meta da União Europeia, para diminuir a perda de biodiversidade, não será atingida. Com efeito, estamos a perder biodiversidade a um ritmo sem precedentes (AEA, 2009).
BIODIVERSIDADE E ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS
A biodiversidade pode ser definida como a variação das formas de vida, incluindo a diversidade genética (dentro da mesma espécie), diversidade de espécies (número de espécies) e diversidade de ecossistemas (diversidade de comunidades) (Norse et al., 1986).
A elevação das temperaturas, mudanças nos padrões de precipitação e eventos climáticos extremos alteram/destroem habitats naturais, afetando a distribuição, abundância e sobrevivência das espécies. Relativamente à biodiversidade vegetal, estas mudanças provocam a modificação da vegetação (tipo, qualidade e quantidade). A lenta capacidade de adaptação de algumas espécies provoca a redução da eficiência dos sistemas e estas enfrentam um risco elevado de extinção
Resultados obtidos por Felicisimo et al. (2011) relativamente à flora da Península Ibérica preveem uma redução geral da superfície climaticamente adequada para quase todos os táxons analisados, com uma elevada proporção dos táxons registados em perigo de desaparecerem até meados deste século, sendo corroborado, em parte, pelas conclusões obtidas pelo Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC, 2014).
ESTRATÉGIAS DE ADAPTAÇÃO ÀS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS
Como refere a APA (2024), o processo de adaptação às alterações climáticas deverá começar imediatamente porque os efeitos do aquecimento já se fazem sentir e este é um processo que irá continuar nos próximos anos. Além disso, as tomadas de decisões não deverão ser
tomadas com base no clima histórico, caso contrário as decisões serão desadequadas e assim não se conseguirá planificar corretamente as estratégias de preparação para enfrentar o aumento da frequência e intensidade de eventos meteorológicos extremos e muito imprevisíveis.
As alterações climáticas antropogénicas em curso e em aceleração estão a ter impacto nos ecossistemas de todo o mundo (IPCC, 2023; Lenoir et al., 2020) e são um dos maiores desafios ambientais que a humanidade se confronta e se confrontará no futuro (Santos, 2021).
Para Santos (2021), são dois os caminhos, que são complementares, a seguir para responder aos desafios climáticos que nos esperam: a mitigação (reduzir as fontes de emissão e potenciar os sumidores de GEE) e a adaptação (processo de ajustamento ao clima atual e ao esperado no futuro, bem como aos impactos nos sistemas humanos e naturais).
Uma das medidas consideradas pelo P-3AC- Programa de Ação para a Adaptação às Alterações Climáticas como estratégia para a adaptação às AC é aumentar a resiliência dos ecossistemas, a prevenção de incêndios rurais, a conservação e melhoria da fertilidade do solo.
Uma das preocupações a ter em conta é a da conservação dos solos. O carbono orgânico armazenado nos solos do mundo é o maior reservatório terrestre de carbono e é pelo menos três vezes maior que o reservatório de dióxido de carbono atmosférico (Amudson, 2001), daí a importância da prática de agricultura de conservação, da manutenção da floresta e da utilização de pastagens permanentes de modo a, pelo menos, conservar os níveis de carbono armazenados.
Neste aspeto também as pastagens permanentes serão fundamentais no combate às alterações climáticas.
A biodiversidade, desejável, das pastagens, terá de ser caraterizada pela presença de várias espécies com diferentes capacidades de adaptação a diferentes condições de solo: fertilidade, profundidade, drenagem, pH, etc., e com elevada plasticidade para tolerar variações climáticas entre anos. Essa riqueza de espécies permite revestir os vários nichos de solo que, normalmente, se verificam numa pastagem (Crespo, 2006; Freixial e Barros, 2012).
Para além das condições edafoclimáticas, terá de se ter em consideração que o tipo de animal utilizador, bem como o maneio das pastagens, afeta a estrutura da pastagem, a composição e a persistência das espécies presentes.
Embora em Portugal, se utilizem, para semear, misturas para pastagens com elevado número de espécies e variedades, estas ainda são, de um modo geral, menos biodiversas que as pastagens naturais. No entanto, essa menor biodiversidade pode ser minimizada caso se introduzam essas misturas recorrendo a técnicas de conservação do solo como é o caso da sementeira direta, uma vez que permite introduzir espécies/variedades com maior potencial produtivo e de qualidade, mas mantendo as espécies presentes as quais estão bem-adaptadas ao local.
O desafio para o melhoramento de plantas aumenta a cada ano, à medida que os agricultores sofrem mais os efeitos das alterações climáticas, enquanto a população e a procura de alimentos continuam a crescer, exigindo um ciclo de melhoramento vegetal mais rápido e mais focado nessas alterações (McLaughlin, 2022).
O melhoramento de plantas é importante para fazer face aos impactos das alterações climáticas, complementando a gestão das culturas e as intervenções políticas para garantir a produção global de alimentos. No entanto, as mudanças nos fatores ambientais também afetam os objetivos, a eficiência e os ganhos genéticos do atual sistema de melhoramento de plantas (Xiong et al., 2022).
O desenvolvimento de novas variedades vegetais melhor adaptadas é essencial para a segurança alimentar global, uma vez que as culturas enfrentam ameaças crescentes decorrentes do impacto do clima, especialmente devido à seca e ao calor em momentos críticos de desenvolvimento durante o ciclo de vida. As estratégias incluem uma maior tolerância ao stress hídrico e térmico através da seleção de plantas com ciclos mais curtos e a capacidade de apresentarem dormência estival ou através da incorporação de genes de tolerância à seca, temperaturas extremas, salinidade. Isto poderá permitir uma maior adaptação a estas alterações climáticas.
Figura 1 . Exemplo de diversidade intraespecífica em espécies pratenses
Para a obtenção de plantas melhor adaptadas é extremamente importante dispor de variabilidade genética necessária para adaptar a agricultura a mudanças futuras. Deste modo, será fundamental aumentar a quantidade e diversidade desses materiais e conservá-los em bancos de germoplasma e impedir que seja perdido. Este material conservado deverá ser bem caraterizado para facilitar futuros usos em programas de melhoramento.
Notas finais
As alterações climáticas são um desafio significativo para a biodiversidade global, mas o melhoramento de plantas poderá oferecer soluções promissoras que contribuem para a capacidade de adaptação dos diferentes sistemas agrários. O uso de espécies e variedades mais adaptadas e a promoção da diversidade genética são estratégias-chave para garantir a resiliência e a sustentabilidade dos ecossistemas agrícolas.
Referências bibliográficas
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Crespo, D. (2006). O Papel das Pastagens Biodiversas Ricas em Leguminosas na Reabilitação da Agricultura Alentejana e na Qualidade dos seus Produtos Tradicionais. Ruraltec, Universidade de Évora, Évora.
Felicisimo, A., Muñoz, J., Villalba-Alonso, C. e Mateo, R. (2011). Impactos, vulnerabilidad y adaptación al cambio climático de la biodiversidad española. 1. Flora y vegetación. doi: 10.13140, p.553.
Freixial, R. e Barros, J. (2012). Pastagens. Texto de apoio para as Unidades Curriculares de Sistemas e Tecnologias Agropecuários, Noções Básicas de Agricultura e Tecnologia do Solo e das Culturas. Escola de Ciências e Tecnologia, Departamento d e Fitotecnia, Universidade de Évora, 38p.
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