Segundo o último Recenseamento Agrícola (2019), Portugal conta com 3 963 945 hectares (ha) de terra arável, hortas e culturas ou pastagens permanentes que são utilizados para fins agrícolas e, destes, apenas são regados 562 255 ha, incluindo todos os regadios públicos e privados. Mas porque é que estes 14% da área agrícola nacional são tão relevantes?
No nosso clima mediterrânico, caraterizado pelos verões secos e precipitações de grande irregularidade concentradas no semestre mais frio, uma forma de conseguir produções agrícolas estáveis passa pelo fornecimento de água às culturas, especialmente em momentos críticos do seu desenvolvimento.
O regadio consegue assim produzir muito mais riqueza por unidade de área – em média cerca de seis vezes maior Valor Acrescentado Bruto face ao sequeiro, contribuindo decisivamente para a balança alimentar nacional, para a criação e fixação de emprego em zonas rurais, constituindo um instrumento de combate à desertificação e luta contra fogos florestais.
Há muito que os agricultores sabem isto, porém muitas vezes não conseguem isoladamente os meios necessários para regar as suas culturas, ficando reféns da aleatoriedade meteorológica e das opções culturais melhor adaptadas a esta mas que, frequentemente, geram baixos rendimentos.
Nos últimos anos, fruto da profissionalização da atividade agrícola, da necessidade de financiamento bancário ou da garantia de retorno ao acionista, os anseios pelo regadio não pararam de aumentar. De Norte a Sul do país multiplicam-se os projetos empresariais, com escala e competitividade económica, que dependem completamente do regadio, seja em culturas tipicamente de regadio, como as hortícolas, seja em culturas tradicionalmente de sequeiro como a Castanha, a Vinha, o Olival ou a Amêndoa.
A qualidade e estabilidade da produção da castanha de Trás-os-Montes, do vinho do Douro, da maçã de Armamar, da pera-rocha do Oeste, do tomate do Ribatejo, do azeite do Alentejo ou da laranja do Algarve dependem hoje completamente do regadio. Acresce que, a jusante da produção, consolida-se atividade agroindustrial exportadora – em muitos casos preponderante na economia regional e frequentemente também de significância nacional.
Cerca de metade do regadio nacional depende de infraestruturas privadas que, tipicamente, conseguem apenas a regularização hídrica intra-anual – armazenando água no inverno para usar no verão. Mas hoje e em contexto de alterações climáticas, é premente também assegurar a garantia de fornecimento de água mesmo em anos de pouca chuva.
O regadio coletivo, quase sempre de iniciativa pública, reparte o investimento por muitos beneficiários, pode trazer a profissionalização da sua gestão e, em alguns casos, consegue atingir a escala que permite a desejada regularização interanual dos recursos hídricos.
O investimento público em regadio é altamente reprodutivo, isto é, gera investimento privado muito relevante, tipicamente da mesma ordem de grandeza contabilizando apenas a reconversão agrícola inicial, fomentando o desenvolvimento económico regional através da cadeia de fornecimento de fatores de produção bem como do escoamento dos produtos com eventual transformação agroindustrial.
Nos regadios existentes, muitas vezes estruturas envelhecidas projetadas e construídas com a tecnologia de há várias décadas, a reabilitação / modernização pode trazer enormes benefícios. Por exemplo, o aumento dramático da eficiência hídrica da reconversão dos sistemas de adução em canal para tubos fechados pode ser significar uma redução para metade do consumo, aumentando a resiliência do sistema ou possibilitando o crescimento das áreas regadas.
Nos novos regadios, os benefícios socioeconómicos podem ser muito expressivos, com a dinâmica empresarial ocorre frequentemente uma desejável consolidação fundiária e cria-se uma barreira contra a desertificação física e humana.
Em 2022, mais do que nunca, Portugal precisa de mais e melhor regadio!
Presidente do Conselho de Administração da EDIA