As preocupações ambientais, em maior ou menor grau, são hoje partilhadas de forma generalizada, existindo um razoável consenso sobre o que se impõe fazer para assegurar que o mundo que deixamos às gerações futuras lhes permita uma plena satisfação das suas necessidades num ambiente saudável e equilibrado.
Este razoável consenso é o fruto de um processo evolutivo complexo em que, muitas vezes, o ambiente e as atividades produtivas foram vistos como antagonistas irreconciliáveis. À escala global, no domínio das políticas públicas, o primeiro alarme foi dado, e as primeiras medidas foram tomadas, em 1972 no âmbito da “Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano”, conhecida por Conferência de Estocolmo. Reconheceu-se, nessa altura, que algumas formas de desenvolvimento podem causar danos irreversíveis no ambiente e procurou-se limitar esses danos com base numa atitude que tem sido designada por “salvaguardas ambientais”.
Passaram 20 anos até que, em 1992, na chamada Conferência do Rio (Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento) se deu um passo decisivo que, em última análise, contraria o antagonismo e, pelo contrário, procura associar de forma virtuosa “ambiente” e “desenvolvimento”. É adotado, então, como grande desígnio a nível global o conceito de “desenvolvimento sustentável”. Este conceito mantém-se até hoje como devendo ser, desejavelmente, o inspirador de todas as políticas públicas de desenvolvimento.
De acordo com a definição clássica, o desenvolvimento sustentável é aquele que permite satisfazer as necessidades das gerações presentes sem comprometer a capacidade das gerações futuras satisfazerem as suas próprias necessidades. Isto é, trata-se de uma forma de desenvolvimento que evita a exaustão ou a degradação dos recursos e que, dessa forma, permite perpetuar no tempo a sua utilização.
É interessante sublinhar que a agricultura é uma das áreas de atividade económica em que este conceito melhor se aplica. Demonstram-no a estreita relação com os processos naturais associados à sazonalidade e aos correspondentes ciclos anuais, bem como à estreita dependência da atividade agrícola relativamente ao recurso solo e ao recurso água. O desenvolvimento sustentável tem, assim, tudo a ver com as boas práticas agrícolas, isto é, aquelas que sejam capazes de usar os recursos (solo e água) sem os degradar ou exaurir. Produtividade e ambiente surgem de mãos dadas, de forma a que as preocupações ambientais se transformem numa garantia da produtividade do solo a médio e longo prazo.
No caso de Portugal, é interessante sublinhar que o clima de fortes características mediterrânicas, com quatro estações bem definidas, implica que a maior disponibilidade de água (oferta) ocorra no inverno, enquanto a maior necessidade (procura) ocorra na primavera, isto é, na fase de crescimento das plantas.
Este desfasamento temporal incontornável entre oferta e procura só pode ser resolvido com armazenamento, de forma a que os excedentes do outono/inverno sejam utilizados na primavera/verão. A componente regada da agricultura num país com as características climáticas do nosso pressupõe, portanto, um armazenamento de água que permita um diferimento temporal, de forma a assegurar em momento posterior a satisfação das necessidades.
As águas subterrâneas podem desempenhar esse papel de armazenamento de forma natural. Contudo, isso só é possível em zonas geológicas com características sedimentares, o que no nosso País quase corresponde apenas à orla mezo-cenozoica relativamente próxima do litoral. No restante território, um bom aproveitamento dos recursos hídricos, pressupõe a construção de estruturas de armazenamento (barragens). Claro que só é aceitável construir esse tipo de estruturas, com algumas óbvias consequências ambientais negativas, quando essas consequências forem minoradas na medida do possível sendo também assegurado um uso eficiente do recurso.
Uma abordagem que tenha em conta este tipo de preocupações permitirá conciliar economia e ambiente, isto é, produção e preservação, de uma forma mutuamente enriquecedora. Esse deve ser, portanto, um importante desígnio da “Ambição Agro 2020-30”.
* Francisco Nunes Correia, Professor Catedrático do Instituto Superior Técnico, Universidade de Lisboa