A Rewilding Portugal, em estreita colaboração com a PSP – Polícia de Segurança Pública da Guarda — a quem manifestamos desde já o nosso profundo agradecimento pela pronta resposta, apoio e profissionalismo — procedeu no passado sábado ao resgate de um juvenil de abutre-preto que se encontrava a deambular desorientado e com sinais de desidratação em área industrial da cidade da Guarda.
Após recolha nas nossas instalações, o indivíduo foi entregue este domingo ao centro de recuperação da CERVAS – Centro de Recuperação de Fauna Selvagem, onde será submetido a avaliação e tratamento veterinário especializados, com o objetivo de recuperar as suas condições físicas, para que, posteriormente, possa ser devolvido à natureza e retomar o seu papel fundamental no ecossistema.
Um momento de atenção
Na manhã de sábado, um jovem abutre-preto foi avistado a deambular desorientado numa zona industrial da cidade da Guarda, apresentando sinais evidentes de desidratação e exaustão. O alerta foi dado por populares e rapidamente a PSP da Guarda, em articulação com a equipa da Rewilding Portugal, acorreu ao local. A ave foi resgatada em segurança, estabilizada nas instalações da Rewilding Portugal e, após observação, foi depois entregue ao centro de recuperação do CERVAS (Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens), onde será avaliada e acompanhada até poder regressar ao seu habitat natural.
“Este tipo de ocorrências mostra como a cooperação entre forças de segurança, centros de recuperação e organizações de conservação é essencial para garantir que estas espécies emblemáticas tenham uma segunda oportunidade na natureza. A articulação rápida da resposta é essencial para possibilitar uma resposta atempada e com capacidade de aumentar a taxa de sobrevivência dos animais recolhidos nestas circunstâncias”, refere o diretor executivo da Rewilding Portugal, Pedro Prata.
O facto de este juvenil ter sido encontrado fora do seu habitat preferencial, em superfície urbana/industrial, sinaliza que as ações de monitorização, resgate e recuperação são vitais para reforçar a conservação da espécie e mitigar riscos (desidratação, colisões, envenenamento, deslocações indevidas etc.).
A importância das aves necrófagas e o papel do abutre-preto
As aves necrófagas desempenham um papel ecológico insubstituível: alimentam-se das carcaças de animais — domésticos e selvagens — atuam como “brigadas de limpeza” naturais, contribuindo para o controlo de potenciais focos de doença, a reciclagem de nutrientes e o equilíbrio dos ecossistemas em que se inserem.
Entre essas espécies, o abutre-preto (Aegypius monachus) sobressai pela sua envergadura e pelo seu estatuto: é a maior ave de rapina que ocorre em Portugal, com comprimentos entre cerca de 98 a 120 cm, envergadura até cerca de 2,5 a 3,1 m e peso que pode alcançar mais de 11 kg nas melhores condições. Além das dimensões impressionantes, o abutre-preto caracteriza-se por:
- plumagem castanho-escura-quase preta, cabeça com penugem clara, bico robusto e curvo;
- preferência por habitats relativamente remotos, áreas montanhosas ou semiabertas, zonas com menor perturbação humana;
- comportamento necrófago: alimenta-se de carcaças de mamíferos de médio a grande porte — selvagens ou domésticos — desempenhando assim uma função santuário.
- forte vulnerabilidade: em Portugal foi considerada extinta como nidificante no início da década de 1970 e apenas recentemente voltou a reproduzir-se no território nacional, tendo colónias muito reduzidas.
No âmbito do projecto LIFE Aegypius Return, com o qual a Rewilding Portugal colabora em algumas iniciativas, está em curso, entre 2022 e 2027, uma estratégia para consolidar e expandir a população portuguesa desta espécie, com objectivos ambiciosos como duplicar o número de casais reprodutores e fortalecer colónias.
O contexto-local e o trabalho da Rewilding Portugal
A Rewilding Portugal tem vindo a desenvolver um trabalho consistente na área da conservação e monitorização de aves necrófagas no Grande Vale do Côa, nomeadamente na região da Serra da Malcata (onde aliás foi responsável pela descoberta de vários ninhos de uma nova colónia de abutre-preto, em expansão), incluindo ações de monitorização, identificação de pontos de alimentação, sensibilização pública e também casos como este de recolha/recuperação de indivíduos em risco. Este resgate concretiza um desses esforços, num trabalho colaborativo entre entidades de protecção da natureza e agentes de resposta emergente.
A entrega no CERVAs permitirá agora acompanharmos de perto a sua evolução — desde a estabilização, tratamento e transporte de regresso à natureza — e evidenciar mais uma vez que intervenções rápidas podem fazer a diferença na recuperação de espécies mais ameaçadas.
Fonte: Rewilding Portugal