Numa altura em que já estão em funcionamento alguns blocos de rega do EFMA (Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva), sendo espectável que os 115.000 ha de área beneficiada estejam concluídos já em 2013, seria de esperar que juntamente com os planos de execução das obras estivesse delineada uma estratégia de gestão das futuras áreas beneficiadas.
Uma das conclusões das jornadas técnicas “Gestão do Regadio” realizadas em Portel nos dias 18 e 19 de Novembro, promovidas pela FENAREG, é que de facto muito pouco está definido sobre a forma como vão ser geridas as novas áreas regadas do EFMA.
O Diagnostico
Por um lado a EDIA preocupa-se em levar a efeito a construção das infraestruturas primárias e secundárias, procurando cumprir os calendários de execução definidos pela sua administração e exigidos pelos sucessivos governos.
Por outro a DGADR, autoridade nacional do regadio, aguarda que a EDIA, após conclusão das obras e ensaios, a notifique de que as mesmas estão terminadas para que possa aplicar a legislação nacional relativa às obras de fomento hidroagrícola, isto é, proceder ao contrato de concessão.
Por outro lado o COTR, há mais de um ano a tentar subsistir com falta de meios, vai fazendo o que pode, muitas vezes aguardando na sua sede as solicitações dos agricultores que manifestem interesse em serem apoiados na transição do sequeiro para o regadio.
Relativamente à DRAPAL, poderia e deveria ser uma entidade mobilizadora dos agricultores…
As associações e organizações de agricultores locais vão observando e constatando que as obras vão avançando no terreno, pouco ou nada intervindo.
Os agricultores não têm sido envolvidos neste processo de “revolução” da passagem de sequeiro para regadio, sendo os contactos apenas estabelecidos por questões de expropriações ou de afectação patrimonial resultante da execução das obras.
Enfim, ouvem-se frases do género “ o que é preciso é fazer a obra, depois logo se vê…” ou “ deixem chegar a água que depois haverá forma da utilizar…” .
De facto, apesar do pesado investimento em estruturas, não existe uma estratégia de organização da área regada e muito menos de desenvolvimento agrícola para este projecto. Esta situação tem sido menos evidente porque nos últimos anos tem havido um importante investimento no olival por parte de empresas espanholas, situação esta que já está em retrocesso, em resultado da crise mundial.
O que nos diz o passado…
Estas jornadas técnicas permitiram em primeiro lugar fazer uma breve e simples constatação histórica:
a) A experiencia das três dezenas de aproveitamentos hidroagrícolas em exploração em Portugal mostra que naqueles em que já havia experiencia de regadio ou em que houve um maior envolvimento dos agricultores na transição do sequeiro para o regadio, o sucesso na utilização das estruturas de rega foi substancialmente maior, traduzido em níveis de utilização acima dos 70 %. Nos outros casos, tal como se está a passar em Alqueva, o nível de utilização situa-se entre 30 a 40%.
b) A experiencia passada também demonstra que o Estado é mau gestor de aproveitamentos hidroagrícolas, sendo vários os maus exemplos. Os casos de sucesso foram sempre conduzidos por associações de agricultores, os quais sabem melhor do que ninguém o que lhes interessa, actuando com eficiência e oportunidade sempre que se afigura necessário.
c) As reduzidas dimensões da área de actuação de algumas associações de beneficiários são um factor limitativo da qualidade dos seus serviços.
O que fazer….
Analisado o passado e os seus ensinamentos, temos que olhar em frente e procurar caminhos de futuro. Foi nesse sentido que nestas jornadas os intervenientes “atreveram-se” a indicar algumas pistas e sugestões de actuação, tendo em vista, de uma forma construtiva, procurar que os principais interlocutores possam vir a valorizar o EFMA. Assim, em jeito de conclusões foram efectuadas as seguintes recomendações:
Quanto à gestão das Obras
• Reforçar as acções de divulgação da obra junto dos beneficiários, assim como a discussão do modelo de gestão;
• Na definição do modelo de gestão e das áreas afectas a cada Associação de Beneficiários, ter em conta a capacidade e experiência das associações existentes na região, nomeadamente a AB do Roxo e a AB de Odivelas;
• Foi proposta como “documento de trabalho” a divisão da gestão das infra-estruturas hidráulicas em função dos subsistemas hidráulicos e zonas de influência, com a interligação das novas Obras com três das Associações de Beneficiários já existentes (Monte Novo, Odivelas e Roxo) e a criação de duas novas Associações (Alqueva e Pedrógão); VER http://www.fenareg.pt/NuncioJT9GESTAO.pdf
• Reunir com os agricultores e suas organizações representativas nas respectivas regiões, com vista à discussão dos modelos, distribuição e constituição das novas Associações de Beneficiários;
• Iniciar contactos entre EDIA e DRAPAL, em conjunto com a DGADR, com o objectivo de promover a formação e calendarização da transferência da obra para as entidades gestoras, com especial destaque para o desencadear da entrega das obras concluídas e testadas;
• Programação com as entidades gestoras das obras de rega dos calendários de entrega e dos planos de gestão;
• Com urgência, definir o tarifário para o fornecimento de água e sua distribuição entre rede primária e secundária.
Quanto ao investimento
• Garantir o reforço das verbas para investimento no regadio (Acção 1.6.3) reafectando a esta rubrica de investimento os 70 M€ que reforçaram no final do 3º QCA o desenvolvimento do regadio de Alqueva;
• O fim da classificação de culturas como “prioritárias”, garantindo como prioritário o apoio a todos os projectos de infra-estruturas para o regadio, incluindo a substituição de equipamentos de rega, pois “a agricultura será sempre de regadio ou não será”;
• Garantir o acesso às ajudas ao investimento pelos agricultores abrangidos pelo perímetro de Alqueva, tendo em consideração que o final das Obras em 2013 coincide também com o final do PRODER;
• Reforço dos apoios ao COTR, estrutura técnica fundamental no apoio às Associações de Beneficiários e às explorações agrícolas, na implementação da gestão, na adesão e na conversão das explorações para a agricultura de regadio.
Quanto às politicas agrícolas
• Reintrodução dos apoios à energia eléctrica;
• Reformulação e agilização das chamadas “Medidas Agro-Ambientais” de modo a garantir o sucesso na adesão e na efectiva aplicação;
• Reformulação da PAC no sentido de garantia de margens necessárias para o desenvolvimento da actividade agrícola;
Muito há a fazer para garantir que a componente agrícola de Alqueva venha a ter condições de sucesso. Vamos a tempo de corrigir, havendo para tal que contar com os fundos comunitários, com o empenhamento da EDIA, DGADR, DRAA, COTR, dos agricultores e das suas associações. A FENAREG lançou o desafio e desde logo está pronta para trabalhar em conjunto com todos para a valorização do regadio do nosso Pais.
Nota: pode consultar todas as intervenções nas jornadas “gestão do regadio” em www.fenareg.pt, menu “documentos”
Ilídio J. S. G. Martins
Técnico e Director da Associação de Regantes e Beneficiários de Campilhas e Alto Sado (ARBCAS)
Vice Presidente da FENAREG (Federação de Regantes de Portugal)
Aplicar uma Lei da Água sem os Agricultores? – Ilídio Martins