Após as visitas às parcelas experimentais na Herdade da Comenda, o Dia do Agricultor 2025 incluiu, no seu programa, uma mesa-redonda intitulada “Da Diversidade Genética à Segurança do Consumidor”.
O objetivo desta mesa-redonda passou por evidenciar o papel do melhoramento de plantas e de uma abordagem de fileira na resposta aos desafios – geopolíticos, edáficos, climáticos – que continuamente se colocam ao setor agrícola e, em particular, às culturas trabalhadas no Polo de Inovação de Elvas.
Com moderação de Astride Sousa Monteiro da ANPOC, a mesa-redonda teve como intervenientes Benvindo Maçãs, anfitrião e Diretor da Unidade Estratégica de Investigação e Serviços de Biotecnologia e Recursos Genéticos do INIAV; Mónica Sobreiro, da MC Sonae e interlocutor privilegiado entre o setor primário e o Clube de Produtores Continente; Jorge Moutinho, Administrador Executivo da Maltibérica; e João Madeira, um dos responsáveis do Centro de Competências do Pastoreio Extensivo.
No arranque da conversa, Benvindo Maçãs explicou a importância das Estações Experimentais de Agricultura enquanto suporte para estudos de longo prazo que investigam as interações entre as práticas agronómicas, o melhoramento genético, e a viabilidade económica das novas soluções. Evidenciou ainda o foco na aplicabilidade desta investigação que se tem traduzido em ganhos efetivos na competitividade das culturas. Aumentos de produtividade, maior resistência a pragas e doenças e maior tolerância a fenómenos extremos são exemplos de contributos diretos para esses ganhos.
Jorge Moutinho, por seu lado, frisou o papel da Lista de Variedades Recomendadas (LVR) do setor da cerveja, uma iniciativa agora integrada no CEREALTECH e que junta Cervejeiros de Portugal e INIAV, como ferramenta fundamental para uma maior eficiência tecnológica. Esta resulta da obtenção de lotes cada vez maiores, mais homogéneos e com características que vão ao encontro das necessidades da indústria cervejeira.
Acentuou ainda aspetos relacionados com a qualidade do produto e segurança alimentar, frisando a qualidade intrínseca da cevada nacional. E reiterou, também, o desígnio dos Cervejeiros de Portugal de fomentarem uma maior incorporação de matéria-prima produzida em Portugal no processo de fabrico. Referindo-se ao caso concreto da Maltibérica, Jorge Moutinho sublinhou a existência de contratos plurianuais com os produtores de cevada dística nacional e, para futuro, a intenção de focar aspetos relacionados com a pegada hídrica e carbónica.
Já Mónica Sobreiro, em resposta ao porquê da aposta da MC Sonae nas farinhas de trigo e centeio Cereais do Alentejo – cuja utilização do selo implica, igualmente, o recurso a variedades constantes na LVR de trigos – evidenciou novamente a questão da qualidade e da segurança alimentar que resulta numa vontade cada vez maior de incorporar cereais nacionais, e não só, numa gama cada vez mais diversificada de produtos. A título de exemplo referiu o fabrico de algumas referências específicas de pão por fornecedores externos, ultrapassando assim o universo das padarias próprias; e o trabalho em curso para desenvolvimento de novas referências de mercearia seca, como o grão-de-bico.
Mónica Sobreiro concordou ainda com a necessidade de Portugal produzir mais cereais, por questões de soberania alimentar e de sustentabilidade, sublinhando a importância de desenvolver projetos de fileira como o projeto LIFE SOS Pygargus. Um projeto ibérico que junta quase uma vintena de parceiros, incluindo a MC Sonae, o INIAV e a ANPOC, e que visa o relançamento da produção cerealífera de Trás-os-Montes, sustentada na criação de uma LVR para a região, enquanto promove a conservação do tartaranhão-caçador, em extinção.
Finalmente, a respeito das pseudo-estepes alentejanas de sequeiro, com problemas ao nível dos solos e sujeitas a fenómenos climáticos cada vez mais extremos, mas que ainda assim têm assistido ao surgimento de vários projetos de sucesso, João Madeira salientou a importância de uma abordagem de sistema agro-silvopastoril, sustentado em rotações trabalhadas com a investigação e, sobretudo, fortemente atento aos índices de encabeçamento.
Sobre a importância de Portugal produzir mais cereais e, em concreto, sobre a medida Ley Farming, preconizada pela estratégia +CEREAIS (Aumento da Produção Sustentável de Cereais em Portugal 2025-2030) e a ser implementada no PEPAC pós 2027, João Madeira alertou que o objetivo de fomentar a produção de cereais nestas regiões através da introdução de esquemas rotacionais de prados com leguminosas e cereais deve ter sempre presente o solo como fator fundamental da equação. E especifica que o foco da investigação, para além da procura de variedades de cereais e de consociações de leguminosas mais adaptadas, e da análise do potencial de criação de uma certificação ambiental do sistema agro-silvopastoril das pseudo-estepes alentejanas, tem de estar no estudo e promoção de uma agricultura cada vez mais de conservação.
Integrando as várias intervenções, Astride Sousa Monteiro concluiu confirmar-se a aplicabilidade e o impacto que o INIAV tem tido na colocação da genética ao serviço do setor, ajudando a aumentar a produtividade ao longo da cadeia de valor e a encontrar um caminho de valorização da produção nacional, seja em regimes mais intensivos ou extensivos, promovendo simultaneamente a sustentabilidade ambiental e a biodiversidade. Um trabalho fortemente enraizado numa perspetiva de fileira que requere esforço contínuo na procura de novas soluções, razão pela qual é essencial a manutenção e reforço de estruturas como o Polo de Elvas do INIAV.
O artigo foi publicado originalmente em INIAV.