Foi hoje publicado o Relatório Final (https://www.icnf.pt/api/file/doc/db8a7fbb541d4bdd) decorrente do Despacho 9353/2023, de 12 de setembro, uma iniciativa do governo no sentido de ultrapassar a contestação relativamente ao corte de sobreiros e azinheiras permitida no caso de projetos com declarações de imprescindível utilidade pública ou de relevante e sustentável interesse para a economia local, como é o caso do Parque Eólico de Morgavel. Na altura foi criado um grupo de trabalho, coordenado pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas com participação da Secretaria de Estado da Conservação da Natureza e Florestas, APCOR – Associação Portuguesa da Cortiça, UNAC – União da Floresta Mediterrânica, MED – Instituto Mediterrâneo para a Agricultura, Ambiente e Desenvolvimento e da ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável.
Foram objetivos do grupo de trabalho avaliar as normas e procedimentos associados à elaboração e implementação dos projetos de compensação para a constituição de novas áreas de sobreiros ou azinheiras e respetivos planos orientadores de gestão, identificar e formalizar propostas de alteração procedimental ou legislativa e avaliar a implementação das medidas compensatórias em vigor e apresentar eventuais propostas de melhoria, nomeadamente ao nível da monitorização e da divulgação.
Prioridade é evitar qualquer corte de sobreiros ou azinheiras
A floresta em Portugal representa mais de 3,2 milhões de hectares, da qual cerca de um terço é ocupada por montados de sobreiro e azinheira. Para a ZERO, o fundamental é assegurar que a imprescindível utilidade pública seja um último recurso depois de se demonstrar que o projeto em causa é relevante e se justifica no quadro de uma análise integrada, mas fortemente ponderada do ponto de vista ambiental e que não existem mesmo alternativas viáveis ao corte de árvores e que esses cortes são efetivamente minimizados.
Legislação em vigor não permite verdadeira compensação nem controlo
Para a ZERO, compensar o corte de sobreiros e azinheiras com uma arborização ou uma beneficiação com majoração de 25% da área afetada pelo corte como está previsto na legislação em vigor (Decreto-Lei n.º 169/2001, de 25 de maio alterado pelo Decreto-Lei n.º 155/2004, de 30 de junho) é manifestamente insuficiente, para além de que não estão em vigor quaisquer garantias de que se assegure o crescimento e manutenção das árvores plantadas. No modelo de compensação atual (arborização ou beneficiação com ou sem adensamento), a recuperação dos valores perdidos hoje só vai ser visível no médio/longo prazo, importando por isso perspetivar fatores de compensação mais exigentes, em função dos valores perdidos. O período de tempo relativo à execução do projeto de compensação (entre 10 a 20 anos), não é compaginável com a verificação, em tempo e no curto prazo, do sucesso dessas medidas e, assim, não são garantia de resultados positivos que reflitam a reparação de danos causados. Mais ainda, não há mecanismo legal que assegure e responsabilize as entidades proponentes pelo insucesso das intervenções realizadas (arborização ou beneficiação).
Compensar – o quê? como? onde? Assegurar – como?
O grupo de trabalho não apresenta no seu relatório final soluções finais que deverão agora continuar em discussão, já que o seu mandato foi prolongado (Despacho n.º 2320/2024, de 4 de março). Existem diversas opções que foram consensualizadas, algumas das quais complementares, para responder a cada uma das questões assinaladas. Para a ZERO, é fundamental que o caminho envolva a necessidade de identificação e quantificação dos valores associados à área afetada pelo corte para se avaliar melhor a necessidade de compensação. E, nesse sentido, haja um fator de conversão de três vezes em relação a área afetada e com cinco vezes mais árvores que as afetadas pelo corte, com a garantia de existência de densidade mínima após 25 anos, contemplando quer uma componente forte de arborização, quer de adensamento. Dever-se-á também prever que uma parte da área a compensar seja reservada à melhoria do estado de conservação de sobreirais e/ou de azinhais já existentes e/ou ao incremento da área de ocupação destes habitats naturais. A prioridade para as medidas de compensação deve ser de áreas próximas das afetadas, existindo um mecanismo de reporte periódico e a obrigatoriedade de uma garantia bancária, com sanções a serem determinadas numa próxima alteração legislativa.
Grupo de trabalho bem-sucedido
A ZERO, que participou no grupo de trabalho criado e que articulou as suas propostas na quadro da coligação C7, uma coligação de organizações Não Governamentais de Ambiente que integra sete organizações (ANP/WWF, FAPAS, GEOTA, LPN, Quercus, SPEA e ZERO), destaca o sucesso de articulação até agora entre os participantes neste trabalho conjunto com a administração, representantes do setor da cortiça e de uma universidade, no sentido de encontrar soluções para manter a área de sobreiros e azinheiras em Portugal.
Fonte: ZERO